Do Blog Comunica Agreste – por Por Bianca Lima e Laís Tavares
Em 2020, ano de eleições municipais em todo país, a briga entre as mesmas famílias pelo poder já é antiga em Caruaru. O cientista político e professor da Associação Caruaruense de Ensino Superior, Asces-Unita, Vanuccio Pimentel, afirma que o panorama político tende a se repetir no próximo ano com as acirradas disputas entre os Lyras, os Queiroz e Rodrigues. Mas a cidade já tem nomes que ameaçam romper com essa política familiar.
Nas eleições de 2016, o candidato Delegado Lessa (PP) com 23,94% dos votos surpreendeu a população caruaruense acostumada em ver apenas no poder as mesmas famílias que, há aproximadamente 30 anos, revezam-se no poder da capital do Agreste pernambucano. Vanuccio ressalta que estamos perto de uma ruptura desse ciclo, mas ela ainda não vai acontecer nas eleições do ano que vem.
Como se constrói esse ciclo da política do familismo?
Essa perspectiva familiar é muito comum no Brasil historicamente falando. Na Região Nordeste, ainda persiste, diferente de outras partes do país. Mas ela é um fenômeno nacional ainda. Nós temos na nossa Região Nordeste uma quantidade de exemplos muito maior do que em outras partes do país. Mas não é um fenômeno nordestino apenas, é um fenômeno brasileiro. No nosso caso, no Estado de Pernambuco, temos uma tradição muito grande desse familismo. Não só apenas com (os ex-governadores) Miguel Arraes e Eduardo Campos (avô e neto respectivamente), que são as figuras mais conhecidas. Também há grupos políticos em vários municípios que têm uma característica familiar. Ou seja, quem têm o capital político e o transfere para membros da família.
Esse fenômeno político ocorre com mais frequência em cidades interioranas?
Não, mas eu acho que na nossa região talvez sim. A predominância dela tem sido no interior por uma série de questões. Muitas vezes por uma ausência de desenvolvimento econômico. Esses grupos familiares permanecem por que, como não tem alguma atividade econômica que faça concorrência ao município ou que apresente uma nova força política, essas famílias acabam se perpetuando e, geralmente, acabam brigando com a outra família, virando uma disputa entre famílias.
Caruaru está dentro desse grupo?
A diferença de Caruaru é que há desenvolvimento econômico e, mesmo assim, a política da cidade é dominada por três grupos políticos. A atual prefeita, Raquel Lyra, é filha de João Lyra Neto, que já foi governador, prefeito e ocupou outros cargos. Raquel também é sobrinha de um outro deputado, Fernando Lyra (já falecido), que foi ministro da Justiça e neta de João Lyra Filho, ex-prefeito da cidade e pai de João Lyra Neto e de Fernando Lyra. Então, vamos imaginar que, no caso específico dela, a família tem 50 anos de atuação na política.
E os outros grupos políticos?
No caso dos outros grupos políticos, a mesma coisa. José Queiroz tem quatro mandatos como prefeito. O seu filho (Wolney Queiroz) é deputado federal há pelo menos seis mandatos e já foi vereador (da cidade) também. O próprio José Queiroz ocupou outros cargos eletivos. Sempre o centro político do grupo é ele e o seu filho, como no caso do grupo dos Lyras, que são Raquel e o pai, Jõao. No caso de Tony Gel é igual. Ascendeu ao poder recentemente, mas deixou o espaço também para esposa que, além de candidata à prefeita de Caruaru, já foi deputada estadual. Hoje, ocupa um espaço na assessoria do governador do Estado (Paulo Câmara).
Esses grupos políticos têm algo em comum?
Todos esses grupos têm a característica de um poder político ser passado para membros da mesma família. Essa é uma contradição porque cada grupo tem o desenvolvimento econômico grande e, só recentemente, a gente tem visto outras forças, sem ser as desses grupos, que começaram a emergir. Significa que pode ser que em um determinado momento a cidade escolha um novo membro. É sempre uma característica de ser pai para filho.
Existem chances de uma quarta força política sem vínculos do familistas assumir a gestão ?
Não vejo a chance de quem ganhar as eleições (de 2020) não seja um desses três grupos porque, quando soma o potencial de votos que esses três grupos têm, não há espaço para uma nova força. Você não vê o espaço eleitoral para uma quarta força emergir. No caso, tivemos, na última eleição (em 2016), uma situação que foi inédita para os últimos 30 anos da cidade.
Como foram os últimos 30 anos de política no município?
Se pegarmos os últimos 30 anos, a cidade foi conduzida até 2016 por três pessoas. José Queiroz no final e no começo da nova república. Depois João Lyra Neto. Em seguida, Tony Gel. José Queiroz de novo. Agora, Raquel Lyra, que é uma pessoa diferente, mas representa esse mesmo grupo Lyra.
Nenhuma pessoa representou uma ameaça real?
A única força política que chegou perto foi Lessa que, na última eleição, ameaçou ir para o segundo turno. Ou seja, ele teve chance real de disputar (a Prefeitura), o que não quer dizer que ele tivesse chance de ganhar. Ele é o primeiro nome que, nos últimos 30 anos, teve força política para chegar a um segundo turno. Quase chegou.
Qual é a probabilidade para as eleições de 2020?
Para essa eleição de 2020, a probabilidade é que o quadro se repita. Ou seja, primeiro quem conduz a prefeitura tem a proeminência porque o prefeito que se reelegeu controla o processo político. Controla a agenda política. Isto é, todas as notícias da cidade sobre política partem da prefeitura. Então, a tendência é que Raquel Lyra entre na eleição como favorita. Nesse caso, precisaria de uma força política ou a união das forças políticas contrárias oposicionistas para tentar criar um bloco que fosse capaz de ameaçar a eleição dela. Mas eu não vejo essa articulação acontecer. O que eu vejo é que ela vai para uma disputa, mas terá oposição. Nos quatro anos de governo, eu não posso afirmar que a prefeitura teve uma oposição sistemática e aguerrida. Quem está no governo sempre controla o processo político, tem primazia sobre ele.
Por que os eleitores acabam votando sempre nas mesmas famílias?
O que eu acho é que prevalece aqui, na nossa maneira de fazer política, uma relação pessoal e emocional muito forte. O brasileiro, de maneira geral, não entende a política de uma maneira desvinculada do emotivo. A maneira do brasileiro de analisar o governo e analisar um gestor tem elementos muito mais emocionais e de características pessoais que de questões objetivas e racionais, relativas ao governo ou às qualidades de uma determinada pessoa, seja de um currículo ou até de uma capacidade administrativa.
Por que este ciclo não muda?
Então, o que gera esse tipo de continuidade é que as pessoas preferem alguém que elas já conhecem, que já saibam o que vai vir e até porque elas teriam um acesso àquela pessoa mais fácil. É muito pessoal a maneira como as pessoas escolhem o voto. O que é muito diferente em outros países, embora o fenômeno familiar na política não é apenas um fenômeno brasileiro.
Quais exemplos existem de familismo em outros países?
Se pegar os Estados Unidos, morreu recentemente o Bush pai, que foi o 43° presidente. O filho dele, George Bush, foi presidente da República também e governador de um Estado. O outro filho dele, também foi governador de um estado e é senador. Então, necessariamente não é um fenômeno brasileiro. Algumas características são bem brasileiras, como a questão emotiva e de fácil acesso pessoal.
O panorama de familismo em Caruaru tende a mudar?
Na próxima eleição, eu acho muito difícil, mas o panorama já mudou. Já existe uma força política, que já participou da outra eleição e vai participar de novo. A tendência é que, no futuro, sim. Hoje, já temos forças com possibilidade de segundo turno. A vitória dessas forças a gente vai ter que esperar mais um pouco, mas o cenário já mudou. A gente precisa ver como vai ser agora em 2020, se Lessa vai conseguir repetir o mesmo resultado dele (de 2016). Todas as três forças têm probabilidade que continuem como estavam na outra eleição, mas vamos ver se novas forças vão entrar, novas forças estão entrando no cenário nacional e a gente não sabe como seria aqui.
“Esse momento de ruptura vai existir”
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